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Crise da soja nos EUA: agricultores de Dakota do Norte enfrentam colapso após retaliação da China
Fazenda histórica prevê perdas de US$ 400 mil em 2025, enquanto Trump pressiona por acordo comercial
Em uma manhã ventosa de setembro, os irmãos Josh e Jordan Gackle se reuniram para discutir a crise sem precedentes em sua fazenda de soja de 2.300 acres (930 hectares), em Dakota do Norte. Pela primeira vez em 76 anos de operação, seu maior cliente — a China — parou de comprar soja americana.
A medida ameaça causar um prejuízo de US$ 400 mil em 2025, deixando os grãos estocados em grandes silos de aço. A interrupção ocorreu após o presidente Donald Trump impor tarifas sobre produtos chineses, em fevereiro, e Pequim retaliar suspendendo as compras de soja.
Antes da guerra comercial, mais de 70% da soja produzida em Dakota do Norte era exportada para a China. Agora, os agricultores enfrentam uma realidade marcada por preços em queda, juros altos e risco de falência em massa.
Negociações na Espanha e conflito de interesses
A crise será pauta central de uma nova rodada de negociações entre Estados Unidos e China, marcada para esta semana na Espanha. O responsável pelas conversas é o secretário do Tesouro, Scott Bessent, que enfrenta suspeitas de conflito de interesses: ele possui milhares de acres de terras agrícolas no próprio Estado, avaliados em até US$ 25 milhões, e que cultivam soja e milho.
Segundo registros, seus investimentos já renderam até US$ 1 milhão por ano em aluguéis. Apesar disso, corretores locais afirmam que ainda não há sinais de que Bessent esteja vendendo suas propriedades, como exige o acordo de ética do governo.
“Uma crise pior que a dos anos 80”
Para agricultores como os Gackle, o impacto da guerra comercial lembra a crise agrícola dos anos 1980, que devastou comunidades rurais nos EUA.
“O nível de estresse é muito maior agora do que era naquela época”, afirmou Jordan Gackle, 44 anos. “Se continuarmos assim, veremos execuções hipotecárias como as de então.”
Outro produtor, Justin Sherlock, presidente da Associação de Produtores de Soja da Dakota do Norte, alertou que os bancos locais já estão restringindo empréstimos a agricultores, o que pode inviabilizar a compra de equipamentos e acelerar a falência de propriedades familiares.
Armazenamento e mercado internacional
Sem a China, os produtores buscam alternativas emergenciais. Empresas como a Arthur Companies estão construindo mais silos e lonas para armazenar até sete milhões de bushels de soja, além de acelerar exportações de milho para liberar espaço.
Contudo, especialistas afirmam que “não há substituto para a China no mercado”. O país asiático continua comprando da Brasil, que se tornou o principal fornecedor global.
“Nunca vi uma interrupção tão monumental na agricultura como a que estamos vivendo agora”, disse Bill Wilson, professor de agronegócio da Universidade Estadual de Dakota do Norte.
Enquanto isso, agricultores de Dakota do Norte aguardam um possível acordo entre Washington e Pequim, conscientes de que o futuro de suas fazendas pode depender das próximas semanas de negociações.
