Política
Com Bolsonaro fragilizado, Tarcísio pode crescer — se souber jogar
Afastamento do ex-presidente abre espaço estratégico para Tarcísio de Freitas avançar como nome da direita, mas movimento exige cálculo político e distanciamento sutil do bolsonarismo radical
A imposição de tornozeleira eletrônica a Jair Bolsonaro, determinada pelo ministro Alexandre de Moraes nesta sexta-feira (18), representa mais que um novo capítulo na crise política envolvendo o ex-presidente. O episódio marca, também, uma possível guinada no xadrez da sucessão presidencial de 2026.
Quem pode sair ganhando com a queda de Bolsonaro é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, apontado em pesquisas recentes como o nome da direita mais competitivo contra Lula, com quem aparece em empate técnico. Mas para que essa janela se abra, Tarcísio precisará de habilidade cirúrgica para se afastar do peso da família Bolsonaro sem perder o apoio da base conservadora.
A família Bolsonaro, especialmente por suas ações erráticas e pela insistência em protagonizar conflitos institucionais, se tornou um entrave à expansão política de Tarcísio, que tenta se posicionar como um “gestor técnico” e não como um ideólogo. Hoje, o ex-presidente é visto até por aliados do Centrão como um problema, e não mais como um ativo político.
Por outro lado, Tarcísio ainda deve um gesto público de solidariedade a Bolsonaro, considerado seu mentor político. Mas esse movimento precisa ser calculado: se for tímido demais, será atacado pelo bolsonarismo raiz, ainda liderado à distância por Eduardo Bolsonaro; se for exagerado, pode perder apoio do mercado, do centro político e de setores produtivos — fundamentais para viabilizar qualquer candidatura presidencial.
A situação se agravou com os novos elementos revelados pela Polícia Federal. A PF apurou que Bolsonaro incentivou articulações com Donald Trump para impor sanções ao Brasil, numa tentativa de pressionar o Judiciário brasileiro a aprovar anistia aos envolvidos na tentativa de golpe de Estado. A investigação revelou que Bolsonaro enviou R$ 2 milhões a Eduardo Bolsonaro para permanecer nos EUA e atuar diretamente nesse lobby.
Em depoimento recente, o próprio ex-presidente confirmou a remessa de recursos ao filho, o que, segundo a PF, reforça a tese de obstrução de Justiça e coação no curso do processo. A consequência direta foi a imposição de medidas cautelares, incluindo o uso de tornozeleira, restrição de uso de redes sociais e proibição de contato com diplomatas e embaixadas.
Enquanto a imagem de Bolsonaro se desgasta, o governo Lula tenta colar em Tarcísio o rótulo de continuidade do radicalismo. Mas o governador de São Paulo tem cartas para fugir desse enquadramento: foi diretor do DNIT no governo Dilma Rousseff, é reconhecido como técnico e tem discurso moderado, o que pode agradar ao eleitorado de centro.
O desafio será convencer a base bolsonarista de que, sem Bolsonaro competitivo, Tarcísio é a única ponte entre o conservadorismo e a viabilidade eleitoral. Isso exigirá, além de racionalidade, um movimento ousado: abraçar o sistema sem parecer parte dele — algo que Bolsonaro jamais aceitou fazer.
Caso falhe, o cenário mais provável é a recondução de Lula ao Planalto, e o fechamento definitivo das portas para a direita nos próximos anos. Mas se conseguir equilibrar os afetos da base com a razão política, Tarcísio pode emergir como o novo nome forte da direita brasileira.
