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Como funcionam os algoritmos que decidem o que você vê nas redes sociais

Da música à política: entenda a lógica das recomendações online e o impacto da falta de transparência nos sistemas que moldam opiniões, comportamentos e até democracias

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Os algoritmos fazem uma curadoria do que vemos a partir de padrões de consumo de perfis semelhantes ao nosso Foto: Adobe Stock

Os algoritmos que definem o que vemos ao abrir redes sociais ou plataformas digitais são muito mais do que códigos invisíveis. Eles representam um sistema poderoso de curadoria de conteúdo que influencia gostos, opiniões, hábitos de consumo e até decisões políticas. Apesar disso, ainda são tratados como uma “caixa-preta” — operam sem transparência e com pouca ou nenhuma regulação.

Na prática, os sistemas de recomendação observam o comportamento de grandes grupos de usuários e identificam “comunidades de gosto”. O que você vê em seu feed não é fruto de uma leitura individualizada de suas preferências, mas da associação do seu perfil ao de outros usuários com comportamentos semelhantes. Isso é chamado de recomendação colaborativa — um modelo baseado em padrões, não em escolhas conscientes.

Da música para o mundo digital

O campo da música foi o primeiro a ser profundamente impactado pela lógica algorítmica. A digitalização acelerada e a necessidade da indústria fonográfica de se reinventar transformaram a música em laboratório dos sistemas de recomendação. Com o tempo, essa mesma lógica passou a ser aplicada a vídeos, notícias, textos e até anúncios.

Esses sistemas tornaram possível algo antes economicamente inviável: a rentabilidade de conteúdos de nicho. O que antes só era lucrativo se vendesse muito, agora gera receita se for mostrado à pessoa certa. Para as plataformas, isso significou controle total da distribuição e dos dados — o que revolucionou o mercado, mas pouco beneficiou os criadores de conteúdo.

Transparência ausente, controle absoluto

Na comunicação, o impacto é ainda mais crítico. A curadoria feita por algoritmos substituiu a programação editorial e a manchete jornalística — sem que o usuário tenha clareza dos critérios utilizados. O resultado é um ambiente em que o que aparece mais é o que engaja mais, não necessariamente o que é mais verdadeiro, relevante ou de qualidade.

Apesar de operarem como gatekeepers da informação, as plataformas alegam não ter responsabilidade sobre o conteúdo publicado, pois fazem apenas “curadoria algorítmica”. Isso legitima a circulação de informações falsas e conteúdos sensacionalistas, muitas vezes mais disseminados do que reportagens sérias.

Desinformação como modelo de negócio

A indústria da desinformação cresceu sem freios. Não se trata mais de militância ou ideologia: hoje, é um mercado profissionalizado, movido por interesses econômicos e políticos. Nas eleições, ela é usada para manipular a percepção pública, interferir em resultados e fabricar “debates” artificiais com ajuda de bots, perfis falsos e propaganda computacional.

A chegada da inteligência artificial generativa amplia esse desafio, ao permitir a criação em massa de conteúdos enganosos com aparência legítima.

Falta de regulação e a tempestade perfeita

Grupos extremistas, especialmente de direita, ocuparam o espaço digital para disseminar suas narrativas à margem da mídia tradicional. Em troca de visibilidade, defendem o ambiente desregulado que garante sua sobrevivência política. O resultado é uma tempestade perfeita: plataformas lucrando com engajamento, criadores explorados, e a sociedade desinformada.

A ausência de regras claras transformou essas empresas nas mais poderosas do mundo. Elas concentram dados, publicidade e distribuição, influenciando até mesmo o jornalismo profissional — que hoje depende das plataformas para ser “descoberto” por novos leitores.

É possível mudar?

Sim. Mas isso exige ação coletiva, regulação eficaz e engajamento político. A desinformação não é um problema individual, e o enfrentamento passa por três frentes: cultural, econômica e política.

Do ponto de vista cultural, é preciso superar a ideia de que os algoritmos são neutros. Economicamente, setores atingidos precisam se organizar e pressionar por mudanças. E politicamente, é urgente aprovar legislações que exijam transparência e responsabilização das plataformas.

A pergunta que deve ser feita é: que modelo de comunicação digital queremos para o futuro? O atual privilegia lucro e desinformação. Mas é possível construir outro, baseado em direitos, diversidade e interesse público.

Redação Saiba+

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